segunda-feira, 5 de maio de 2014

Bicicletas: em que direção?


Da forma como está, o aluguel de bikes atende mais ao marketing do que às demandas de mobilidade
Desde 2012, está em funcionamento em São Paulo um sistema de aluguel de bicicletas --BikeSampa-- patrocinado por um banco, que hoje disponibiliza 1.400 delas em 144 pontos de empréstimo, com compromisso de chegar a 3.000 em 300 pontos ainda em 2014.
Em dezembro do ano passado, foi a vez de outro banco inaugurar seu sistema, CicloSampa, oferecendo bicicletas em mais 15 pontos.
A existência de dois sistemas, que operam praticamente nas mesmas regiões --oeste e sul-, sem nenhuma integração entre si, mostra o quão longe estamos de ter um serviço de aluguel de bicicletas que tenha como objetivo favorecer a mobilidade na cidade.
Como esses sistemas se articulam com a rede de transporte público? Quem define a localização dos pontos e com que critério? Se fosse pela proporção de usuários de bicicletas em seus deslocamentos, bairros como a Vila Maria ou o Jaçanã deveriam ser os primeiros a receber o serviço. Mas nesses lugares não existe nenhum ponto de empréstimo.
Da maneira como funcionam hoje, esses sistemas atendem muito mais às estratégias de marketing dos patrocinadores do que às demandas de mobilidade da população. Isso porque não são parte de um sistema integrado de transporte, planejado e gerenciado pelo poder público e baseado nas necessidades de deslocamento dos paulistanos.
É verdade que o BikeSampa foi integrado ao Bilhete Único e ampliou o tempo da viagem gratuita de 30 minutos para uma hora. E que vários pontos de empréstimo de bicicletas estão próximos a estações de metrô. Mas isso é muito pouco.
O próprio metrô de São Paulo chegou a ensaiar um sistema de aluguel de bicicletas em algumas estações, mas não conta mais com o serviço simplesmente porque a empresa que o operava desistiu do negócio.
Uma das questões que limita um sistema eficiente de circulação por bicicleta é a falta de espaços segregados e permanentes para sua circulação. Hoje, a cidade conta com apenas 63 km de ciclovias. A essas se somam 3,3 km de ciclofaixas, sinalizadas apenas por pintura no asfalto, e 120 km de ciclofaixas de lazer, segregadas e sinalizadas aos domingos e feriados.
Quando inaugurou seu sistema de aluguel de bicicletas, Nova York já contava com mais de mil quilômetros de ciclovias. Por isso, nos primeiros meses de funcionamento, o sistema já contabilizava mais de 4 milhões de viagens.
A Prefeitura de São Paulo anuncia que chegaremos a 200 km de ciclovias até o final do ano. As experiências de outras cidades mostram como isso é importante para o sucesso da implementação de qualquer serviço de aluguel de bicicletas que não se resuma a marketing empresarial.
Inaugurado em 2007, o Vélib, sistema de aluguel de Paris, começou com a oferta de 7.000 bicicletas em 750 estações. No ano passado, o serviço já oferecia 20 mil bicicletas, espalhadas em 1.200 estações, alcançando a surpreendente proporção de 1 bicicleta por 97 habitantes.
Experiências como essas devem nos inspirar. O desafio urgente que a cidade nos coloca é como articular e integrar um sistema no qual seja possível pedalar em segurança e acessar estações de metrô e corredores de ônibus.
Enfim, circular com liberdade, conforto e eficiência pela cidade.
RAQUEL ROLNIK 
Folha, 05.05.14.

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